Declaração de movimentos de mulheres e feministas Encontro da Sociedade Civil frente à VI Cúpula de Presidentes dos Países BRICS

Nós, redes e movimentos feministas do sul global, reunidas em Fortaleza, de 14 a 16 de julho, por ocasião da VI Cúpula dos/as Presidentes/as dos países BRICS, estamos comprometidas com a transformação social e a construção de Estados realmente democráticos e laicos, que garantam o exercício e a ampliação dos direitos humanos das mulheres, a justiça socioambiental e a redistribuição de recursos e de poder.

Entendemos que o momento histórico de crise de civilização exige a presença crítica e propositiva dos movimentos sociais do Sul Global, na arena política mundial. Nesse processo, nós mulheres somos sujeitos de nossas próprias reivindicações, falamos em nosso próprio nome e nos posicionamos desde nossas próprias leituras e práticas políticas.

Entendemos que a emancipação das mulheres exige o enfrentamento da ofensiva do capital sobre os territórios onde vivemos, o ar que respiramos, a água que bebemos e sobre nossos corpos. E que é urgente deter o processo de perda de direitos a que estamos submetidas pela dinâmica perversa das políticas impostas pelas instituições financeiras, pelos governos dos países ricos e poderosos do mundo, assim como dos países emergentes do bloco BRICS, bloco no interior do qual também se reproduz a divisão entre países produtores primários e países industrializados. Em ambos os contextos, as mulheres no campo são as que vivem as situações mais agudas de pobreza.

Repudiamos o crescimento do fundamentalismo religioso e sua influência sobre as políticas públicas que usa argumentos reacionários e conservadores para reiterar a lógica androcêntrica e heteronormativa, coibir a autonomia sexual e auto-determinação reprodutiva das mulheres, limitando as possibilidades de prazer e estigmatizando as identidades sexuais que diferem da norma dominante.

Seja quando promovido pelos BRICS ou pelo G7 ou G20, nos manifestamos contra o desenvolvimento que concentra riquezas e poder, baseado na exploração das pessoas e da natureza, no consumismo exacerbado, na violação dos direitos humanos, na apropriação de nosso trabalho, nosso corpo e nosso território. É preciso superar a divisão sexual do trabalho e a super-exploração do trabalho da mulheres que dela decorre.

É preciso resistir e lutar contra a hegemonia da economia capitalista, e reconhecer legitimidade a outras formas de economia e de produção do viver, em bases colaborativas e solidárias.

É preciso democratizar a democracia política formal e superar sua herança burguesa que sustenta sistemas de poder excludentes, patriarcais e racistas, controlados pelo poder econômico e pela grande mídia a ele associada. E ainda ir além, construindo a radicalização da democracia na economia, na cultura e na vida cotidiana.

Lutamos pela construção de alternativas econômicas, políticas, sociais, culturais e de relações entre nações, baseadas na solidariedade, na redistribuição da riqueza, do poder e dos cuidados. Lutamos pelo fim do racismo e do patriarcado, pela autonomia sobre nossos corpos, nossa reprodução e nossa sexualidade, em cada um de nossos países e em toda a terra.

Tomamos conhecimento da Declaração dos Presidentes na VI Cúpula dos BRICS e entendemos que, apesar de manter os rumos previsíveis na articulação econômica e financeira e nos posicionamentos sobre segurança e paz mundial, ela menciona e aponta indicativos positivos para garantia dos direitos das mulheres e a possibilidade de democratização da internet, reconhecendo e respondendo, no âmbito dessa Declaração, a algumas das reivindicações históricas das lutas dos movimentos de mulheres e feminista: direitos das mulheres, desigualdade de gênero, direitos das pessoas jovens, saúde sexual e reprodutiva para todas e todos e direitos reprodutivos. Embora essas menções sejam importantes como ponto de partida e parâmetro para monitoramento das ações dos BRICS, consideramos inaceitável a ausência de menção aos direitos sexuais e reafirmamos que palavras são importantes mas insuficientes. Demandamos o imediato fim das perseguições e da criminalização das pessoas por causa das suas sexualidades e a garantia de efetivação desses direitos na vida cotidiana.

Nós, presentes no Encontro das Organizações da Sociedade Civil frente à VI Cúpula dos/as Presidentes/as dos Países BRICS, nos comprometemos, com os movimentos sociais do mundo, a construir alternativas radicalmente diferentes das que dominam, para afirmar os bens comuns e gerar possibilidades de bem viver.

Fortaleza, 14,15 e 16 de julho de 2014.

Assinam:

Articulação de Mulheres Brasileiras

Articulacion Feminista Marcosur

Red de Mujeres Afrolatinoamericanas, Afrocaribenhas e da Diáspora

REPEM – Rede de Educação Popular entre Mulheres da América Latina e do Caribe.

Rede Nacional de Mulheres de Colômbia

Unión Latinoamericana de Técnic@s Rurales y Agrari@s

Trabajadoras Estatales – ATE-CTA (Argentina)

Observatório de Sexualidade e Política/ABIA

Católicas pelo Direito de Decidir

Rural Women Assembly – South Africa

Créditos Foto: SOS Corpo

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